STJ anula inquérito policial contra ex-secretária de Saúde acusada de encomendar “trabalho espiritual” visando morte de autoridades de São Simão (GO)

Com informações Rota Jurídica

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu ordem em habeas corpus para determinar o trancamento de ação penal e anular inquérito policial contra a ex-secretária de Saúde de São Simão de Goiás, no interior do Estado. Ela foi denunciada pelo Ministério Público de Goiás (MPGO) pelo crime de ameaça por, supostamente, ter encomendado “trabalho espiritual” visando a morte de autoridades daquele município.

Contudo, o entendimento dos ministros da Sexta Turma do STJ, foi o de atipicidade da conduta. Os magistrados seguiram, à unanimidade, voto da relatora, ministra Laurita Vaz. Foi determinada, ainda, a anulação de busca e apreensão, quebra de sigilo telefônico e suspensão do exercício das funções públicas. As medidas cautelares haviam sido deferidas por juízo de primeiro grau, após representação policial. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) negou pedido para trancamento da ação penal.

Em seu voto, a ministra acolheu parecer do Ministério Público Federal (MPF) no sentido de que não se verificou o elemento subjetivo exigido (dolo) para a tipificação da conduta. Além disso de que, por mais reprovável que tenha sido a atitude da paciente do ponto de vista moral, especialmente por ela ocupar à época o cargo de secretária de saúde municipal, “a conduta descrita é irrelevante no âmbito penal”.

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Perplexidade

No parecer do MPF, foi apontado que o caso causa perplexidade, “pois, as circunstâncias fáticas e jurídicas existentes à época, se analisadas com a frieza e equilíbrio necessários, não permitiriam a instauração de inquérito policial nem quiçá as gravosas medidas de busca e apreensão domiciliar, quebra do sigilo telefônico e suspensão do exercício das funções públicas”.

O MPF recomendou, ainda, a expedição de ofícios às Corregedorias da Polícia Civil do Estado de Goiás e do Ministério Público de Goiás, para apurar eventual infração disciplinar.

Não comprovado

Já a ministra esclareceu, ainda, que o delito de ameaça somente pode ser cometido dolosamente, ou seja, deve estar configurada a intenção do agente de provocar medo na vítima. Contudo, segundo disse, não houve, na representação policial e na peça acusatória, nenhuma menção a respeito da intenção de infundir temor. Tão somente foi narrada a contratação de trabalho espiritual visando a “eliminar diversas pessoas”.

A ministra esclareceu que o tipo penal, ao definir o crime de ameaça, descreve que o mal prometido deve ser injusto e grave, ou seja, deve ser sério e verossímil. “A ameaça, portanto, deve ter potencialidade de concretização, sob a perspectiva da ciência e do homem médio, situação também não demonstrada no caso”, completou Laurita Vaz em seu voto.

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O caso

Segundo consta na denúncia do MP, a então secretária teria encomendado o “trabalho espiritual” por não se conformar com procedimento investigatório contra o prefeito da cidade, suspeito de envolvimento em crimes sexuais contra menores. Ela teria pagodo R$ 5 mil a uma mulher para a aquisição de diversos objetos utilizados no ritual de cunho religioso, como “cabeças de cera”, pequenos caixões e um “boneco Vodu”, no qual escreveu o nome dos ofendidos.

Consta que a promessa de “mal espiritual efetuada por ela se mostrou idônea a ameaçar diversos ofendidos residentes em São Simão, cidade do interior de Goiás com população notadamente religiosa, sendo este um traço marcante da cultura local.”

Defesa 

A defesa da secretária, feita pelo escritório Edemundo Dias Advogados, alegou que não há como se iniciar uma investigação contra uma pessoa com base no fato de que houve um pedido de “trabalho espiritual”. E que não há vínculo causal entre esse ato e o crime de ameaça, que necessariamente deve ser desferido contra alguém. A defesa considerou típico caso de crime impossível. Inclusive, pontuou que a questão fere preceito constitucional da liberdade religiosa.

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